quarta-feira, 2 de outubro de 2013

Machismo: tendência old fashion? A visão deles sobre a questão

Na mesa 4: Fel Mendes, Ricardo Lombardi, Ivan Padilha e, o membro da FFCL Dante Felgueiras debatem sobre como o conteúdo das revistas masculinas afeta os homens, mediados pelo professor Carlos Costa. / Imagem: Marina Braga
Apesar de a Frente Feminista Casperiana Lisandra já ter protagonizado interessantes discussões a respeito do papel da mulher em diversas esferas da sociedade e sua relação com o machismo, era preciso promover um debate que viesse sob uma nova ótica, afinal é sempre bom buscar novas maneiras de enriquecer nossas reflexões. Partindo do pressuposto de que se devem ouvir os dois lados de uma questão, a Frente resolveu convidar conceituados jornalistas do mercado de revistas masculinas para que, a partir da experiência deles, explicassem o processo de concepção das matérias veiculadas em suas revistas e, mais importante: o quanto elas contribuem ou possam vir a contribuir para a perpetuação do machismo.

Como o homem se relaciona com aquilo que lê nessas revistas e se isso colabora para seu comportamento sexista. Essa era, provavelmente, a maior questão pela qual se esperava algo o mais próximo possível de uma “resposta”. O primeiro a dar a palavra foi o Maurício Barros, diretor de redação de PLACAR. “Me parece que o futebol seja o último reduto do machismo tosco e borracheiro”, talvez tenha sido uma das suas poucas considerações relevantes no fomento do debate. Infelizmente, Maurício tinha um compromisso que o impossibilitou de ficar até o fim, mas enquanto esteve presente pouco acrescentou e comentou a respeito da mulher no contexto dessas revistas, reduzindo suas colocações a respeito da mudança editorial pela qual PLACAR passou nos últimos tempos e, o que me pareceu no mínimo irônico em se tratando de um debate promovido por uma frente feminista, de como PLACAR é “uma revista de macho”. Se foi por brincadeira que ele comentou isso ou não, deixo que vocês tirem suas próprias conclusões.

Logo depois foi a vez do Ivan Padilla, diretor de redação da GQ. “Não é fácil fazer uma revista masculina porque o homem se relaciona com a revista de maneira diferente das mulheres. Vejo na Glamour (que fica no mesmo prédio) mulheres que vão na redação pra conhecer a equipe, não é o que acontece na GQ.  O leitor masculino é um pouco mais cético”. Justamente por esse envolvimento mais “superficial” do homem, tanto o Ivan quanto o Ricardo Lombardi (diretor de redação da VIP) acreditam que é mais libertador escrever para homens, mas também complicado quando o assunto são as belas mulheres que estampam as capas de suas publicações. Quando indagados sobre o padrão de beleza dessas modelos, Ricardo foi categórico: “Quanto mais famosa for a mulher, mais ela vende. A revista é um negócio, ela precisa dar lucro. É uma lógica capitalista que continuará valendo. Já coloquei famosas na capa que nem eram tão interessantes, mas porque eu sabia que venderia mais do que se eu colocasse uma desconhecida. Mediador do debate, o professor Carlos Costa, que citou o sociólogo e semiótico Eliseo Verón para explicar essa perspectiva mercadológica: de acordo com o argentino, existe um contrato de leitura, que é a relação estabelecida entre leitores e publicação, isto é, o leitor tem uma demanda a qual essas publicações se comprometem a atender. Se o leitor percebe uma “traição” por parte desses veículos, ele então “rompe” o contrato e não mais compra a revista.

Ainda sobre a lógica da mulher como “objeto do prazer hedonista do homem” através dos ensaios sensuais, eles explicaram a difícil conciliação entre agradar o leitor que compra a revista para ver a mulher (“sabemos que o homem compra a revista pela mulher na capa, mas tentamos oferecer algo a mais para ele”, de acordo com Fel) e a modelo que pede para ser retocada porque vê defeitos na foto original. “Mostro pras modelos as fotos, mas elas reclamam. Há o dilema: tenho o compromisso com o público, mas tenho de agradar a modelo”, como colocou Ricardo. Para Fel Mendes, redator-chefe da Sexy, também “é uma situação muito delicada: a mulher tira a roupa com umas 8 pessoas no estúdio e, por isso, nem sempre se sente à vontade para algumas fotos. A depender do que a gente ofereça, a gente recebe reclamação do leitor. Sei que a Sexy ainda carrega este machismo da mulher objeto, mas tentamos fugir disso”. Já o Ivan completou explicando que essas fotos giram entre os eixos aspiracional e inspiracional, mostrando aquilo que provoca, insinua, mas não de forma escancarada. Se dependessem dos debatedores, as fotos receberiam o menor retoque possível.

Mas e o machismo? “O machismo é absolutamente old fashion”, resumiu o Maurício aquilo que foi consenso para os jornalistas convidados. Para eles, o homem tem mudado e, por isso, não cabem mais “pautas para o homem alfa”.  De acordo com o Ricardo: “Não dá pra fazer uma revista masculina machista em 2013, desconectada do mundo. Temos um cenário em que a mulher se coloca numa posição bastante interessante. A nota de corte dela aumentou bastante, o homem hoje tem de ter um repertório cultural”. Já para o Fel, talvez exista uma realimentação desses estereótipos sexistas, mas a sacada é tentar fugir disso, até porque “existe também um senso crítico, o leitor não assimila tudo assim”. E completou: “Acho que a melhor maneira de mostrar o machismo para o homem é trazer com certo humor essa discussão pra mostrar que ele é sim machista”.

O jornalismo masculino pode ter mudado, acompanhando esse homem contemporâneo, mas isso não significa que o DNA de suas revistas tenha alterado. “A gente continua falando com o macho urbano, mas cada um a sua maneira”, segundo Ricardo. As revistas para o público masculino seriam o momento do homem para si, “um momento de transgressão desse homem que convive em espaços que há maioria feminina. Acho que tem momentos e momentos da vida. É a revista dele, o momento dele. Ele não precisa negociar com a mulher. É um momento que ele se relaciona consigo mesmo e não com o mundo”.

Quanto dessa relação do homem é capaz de prejudicar a mulher no tange ao estabelecimento de padrões que corroboram num pensamento machista? Isso não foi respondido na mesa de terça, mas deveria ser pensado mais vezes. Apesar da dinâmica mercadológica necessária para manutenção dessas revistas, o olhar cuidadoso ao conteúdo delas deve ocorrer. Ainda que este macho urbano seja contemporâneo e não mais tenha vontade de consumir um conteúdo preconceituoso, não devemos esquecer que nessa selva de pedra, ainda há muitos “alfas” rondando.


+ Vídeo postado no instagram da Lisandra com trecho da palestra

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