As nossas
e as suas vozes
Imagem: Eliza Capai / Arte: Giovanna Cartapatti |
O texto discutido foi uma matéria do jornal da Unicamp
sobre o livro “Vozes do Bolsa Família”, pesquisa desenvolvida pela socióloga
Walquiria Gertrudes Domingues Leão Rêgo, professora titular do Departamento de
Ciência Política do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) da
Unicamp, e pelo filósofo italiano Alessandro Pinzani, professor adjunto de
Ética e Filosofia Política da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
O livro foi criado com a finalidade de averiguar em
que medida o programa mudou a vida das famílias e, em particular, das mulheres
que receberam a bolsa. Em todo o Brasil, o Bolsa Família atende a 13,7 milhões
de famílias – sendo que 93,2% dos cartões estão em nome de mulheres. São elas
que recebem e distribuem a renda familiar.
Xs pesquisadores analisam: “A libertação da
‘ditadura da miséria’ e do controle masculino familiar amplo sobre seus
destinos permite às mulheres um mínimo de programação da própria vida e, nesta
medida, possibilita-lhes o começo da autonomização de sua vida moral. O último
elemento é fundante da cidadania”.
“Nunca é demais lembrar que nossa pobreza não é um
fato contingente, mas deita raízes profundas na nossa história e na forma de
conduzir politicamente as decisões estatais”, avalia Walquiria. “O Bolsa
Família deveria se transformar em política pública, não mais política de um
governo. É um processo, um avanço que mal começou e ainda é muito insuficiente.
Mas quem narra uma história tem que ser capaz de narrar todos os passos desta
história”, finaliza a pesquisadora.
Imagem: Marina Braga |
“A clássica resposta sobre essa questão é a de que
elas são melhores gestoras das finanças familiares e de que seus maridos
normalmente são incapazes de fazer compras adequadas às necessidades familiares
ou gastariam o dinheiro em bebidas. No entanto, muito mais que referendar essa
justificativa, a decisão do governo em destinar o benefício do programa às
mulheres (muitas passaram a dispor de uma renda fixa pela primeira vez)
representou, para as destinatárias, a conquista de maior independência e
segurança. Em sua maioria, afirmaram se sentir mais livres (ou “à vontade”, nas
palavras delas) e menos angustiadas no que diz respeito à capacidade de
adquirir bens primários para suas famílias”, relatam Valquíria e Alessandro à
matéria da Revista da Unicamp.
Trechos do livro:
Em seguida nos dirigimos para a residência de Dona
Madalena, agora com 35 anos. Encontramo-la “batendo feijão” na sua minúscula
propriedade. Veio nos atender de modo sorridente, muito diferente do ano
anterior, quando a encontramos lacônica, de semblante sombrio, tendo caído em
prantos a certa altura da entrevista. Fotografamo-la juntamente com seus
filhos, e neste momento ela fez questão de contar que no ano anterior a
tínhamos encontrado num dos momentos mais difíceis de sua vida, pois queria se
separar do marido. Agora, havia conseguido a separação e a vida havia melhorado
muito. Perguntamos-lhe quanto estava recebendo pelo programa BF, e ela muito
alegre nos disse: “Estou recebendo R$ 112 com esse pequeno aumento que teve”.
(...)
Do ponto de vista das mulheres entrevistadas, salta aos olhos seu desejo de garantir um futuro melhor a seus filhos. Pode-se dizer que é essa quase sua única esperança na vida: fazer deles pessoas menos destituídas de capacitações do que elas, enfim, equipá-los melhor para que busquem outro destino.
(Relato em Inhapi-Al, 2007)
(...)
Do ponto de vista das mulheres entrevistadas, salta aos olhos seu desejo de garantir um futuro melhor a seus filhos. Pode-se dizer que é essa quase sua única esperança na vida: fazer deles pessoas menos destituídas de capacitações do que elas, enfim, equipá-los melhor para que busquem outro destino.
(Relato em Inhapi-Al, 2007)
Após a leitura desse relato, refletimos sobre a
vida dessas mulheres e o que é o feminismo para nós e para elas. Mais uma vez,
é preciso reconhecer a hierarquia de opressões. Mulher branca, mulher negra,
mulher homossexual, mulher negra, mulher índia, mulher pobre. Somos muitas mulheres!
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