sexta-feira, 23 de maio de 2014

Reflexões sobre a Marcha das Vadias


Créditos da imagem: Zanone Fraissat/Folhapress / Arte: Camila Araújo         
Às vésperas da IV Marcha das Vadias, em São Paulo, a Frente Feminista Casperiana Lisandra promoveu uma roda de conversa sobre o evento. Com a presença das convidadas Gabriela Freller e Isadora Szklo (RUA), Carolina Borghi Ucha (JUNTAS) e Beatriz Beraldo Batista, que defendeu a Marcha em sua tese de mestrado na ESPM, a reunião descontruiu e, em seguida, reconstruiu o significado desse acontecimento do próximo sábado (24 de Maio).
Beatriz Beraldo, pesquisadora da Marcha
fez a primeira fala / Foto: Marina Braga
“A mulher na sociedade é esquartejada”, iniciou Beatriz. Com o seu trabalho “POR SAIAS E CAUSAS JUSTAS: feminismo, comunicação e consumo na Marcha das Vadias”, a estudante, e também ativista, criticou a relação da publicidade com a mulher e com a Marcha. À medida que essa mídia não nos trata como sujeito, o produto passa a ser o nosso porta-voz e as joias, sapatos e outros artefatos acabam por nos representar nas propagandas. Dessa forma, falar sobre a mulher referindo-se apenas às partes do seu corpo passa a ser algo comum na sociedade. Não é à toa, portanto, que os jornais e a internet divulgam algumas manifestações feministas com enfoque apenas nas partes do corpo despidas durante o evento, como o topless. Assim, deixam de lado toda a ideologia e os debates envolvidos no movimento.  
Carol Ucha, do coletivo Juntas, deu
sequência no debate / Foto: Marina
Braga
Em seguida, Carolina levantou a questão da importância da Marcha: é um dos primeiros contatos das pessoas com o feminismo mais a fundo, disseminando-o. “Vá lá e converse com as pessoas”, recomenda. Segundo ela, esse ano, após as jornadas de Junho de 2013, as constantes greves e manifestações contra a Copa, além das polêmicas de assédios no metrô, a pesquisa incorreta divulgada pela IPEA em relação ao estupro e o assédio sofrido pela bandeirinha recentemente em uma partida de futebol, indicam que a Marcha terá uma boa repercussão.
Gabriela Freller, representando o coletivo
RUA, fez a última fala, que abriu o debate
para o restante das pessoas na roda / Foto:
Marina Braga
Apesar das grandes expectativas, Gabriela mostrou alguns problemas que o evento enfrenta: o enfoque na emancipação individual, o uso da nudez (que tem um papel importante, mas só aparece na mídia pelo seu conteúdo sexual) e a inibição causada a mulheres que não se reconhecem com o termo “Vadia”, que foi tomado como forma de protesto após a fala de um policial canadense, que se pronunciou sobre uma onda de estupros que vinham acontecendo no Canadá, dando, então, origem à Marcha em 2011 no mesmo país.
O debate continuou com a questão da mulher negra no movimento feminista. Devido ao fato de muitas mulheres negras já se declararem contra a Marcha Das Vadias, Isadora explicou que muito disso se deve à época da colonização. Como as brancas eram “materiais para o casamento” e, portanto, intocáveis, os homens precisavam provar sua virilidade mantendo relações sexuais com suas amantes, no caso, as escravas negras. Assim, foi atribuído a elas um estigma sexualizado de maneira pejorativa até hoje.
O tema desse ano da Marcha das Vadias é "Quem cala não consente" colocando em pauta
a questão da cultura do estupro / Foto: Marina Braga
Além disso, foi levantada a questão da complexidade social em que essas mulheres estão inseridas. A negra, principalmente a de periferia, se vê diante de um dilema: sobreviver ao lado do seu opressor ou lutar pelos seus direitos como mulher juntamente à sua patroa racista. Grande parte possui demandas mais urgentes que remetem à sua própria sobrevivência. Dessa forma, o machismo existente em suas vidas acaba não sendo detectado.

Muitas histórias e reflexões foram levantadas em torno dessas questões e a reunião extrapolou seu limite, ocorrendo até 19h30min da quinta-feira. Entretanto, ficou claro para todas nós que ainda se tem muito para discutir, aperfeiçoar e, principalmente, lutar. Quem cala, NÃO consente!

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